quinta-feira, 24 de junho de 2010

O palavrão

O palavrão

Palavrão se aprende na escola. Mais ou menos. A escola é só um meio de propagação do palavrão. É normalmente nos almoços de família, no domingão que os pais e tios estão assistindo um jogo de futebol que o moleque ouve o temido palavrão. Quase sempre é o juiz quem sofre as retaliações verbais, se pensarmos literalmente, a mãe dele. Pensando na pratica, quando alguém solta um “filho da puta”, dificilmente a pessoa quer falar na inocente mãe por trás da expressão.
Por exemplo, “caralho”. Hoje quase nunca se usa essa palavra como o sinônimo do órgão reprodutor masculino. Pensamos na frase: “Churrasco é bom pra caralho”. Uma mãe mais conservadora tem vontade de chorar ao ouvir. Mas gramaticalmente falando, o “caralho” tem a função de advérbio de intensidade, mas com um grau muito acima de um “bom demais”, um “bom pra burro (o animal quadrúpede?)” ou um “bom pra chuchu (???)”. Ou quando a pessoa fica realmente entusiasmada ao fazer um strike e diz ”jogar boliche é muito legal”. O entusiasmo é tão maior quando se diz algo como “ jogar boliche é bom pra caralho”. E ainda juntando dois palavrões “estou puto pra caralho”, quer dizer que a pessoa está infinitamente mais brava do que quando diz um “estou muito bravo”
Na Bahia quem é de fora se assusta quando uma mulher diz que “a Ivete é de fuder”. Lá quando alguma coisa é extremamente boa, se usar qualquer advérbio ou comparação metafórica é pouco perto de um “é de fuder”
O palavrão ainda tem uma função fisiológica para extravasar sentimentos. De noite quando levantamos para tomar uma água ou ir ao banheiro e damos com o dedo mindinho na quina de algum móvel e vem aquela dor alucinante. Nada melhor que um “puta que o pariu” de boca cheia. Sem um palavrão desse parece até que a dor não passa. Ou ainda quando alguma coisa ruim acontece, por instinto sai um “que merda”.
O palavrão está tão presente no dia a dia que é um pouco difícil evitá-lo, e por traz do termo pejorativo está uma forma lingüística que não está nos dicionários e nas aulas de gramática. E cada vez menos significa a parte feia, mas sim um sentido que não se consegue expressar com as palavras normais.
Mesmo uma pessoa que se gaba por não falar palavrão, se estiver no transito e alguém fechá-la, sem dúvida nenhuma ela se coça pra abrir a janela e gritar um carinhoso “vai tomar no cu”.

Crônica escrita por
Ricardo Velasco Leal

Nenhum comentário:

Postar um comentário